8.8.12

TRIBUTO AOS HOMENS DO TAMBOR "o canto e o som do batuque"


                                                                                    (texto transcrito , João Carlos D`eodé )

Em toda a minha vida religiosa conheci um cem número de Tamboreiros, cada um com suas particularidades, características e personalidade.Posso citar alguns nomes, mas tenho medo de pecar no esquecimento de outros tantos que fizeram nome e tornaram-se verdadeiras lendas.Para isso vou usar de um critério que penso me tornará imunes as criticas, ou seja, a de citar unicamente os que eu vi e ouvi tocar e cantar.Sempre existira os que não vi, e não conheci, mas vou me restringir aos que tocaram em minha época e dentro do que eu denomino: A Grande Porto Alegre, (Viamão, Novo Hamburgo, Canoas, São Leopoldo, Sapucaia, Cachoeirinha e adjacências).Entre os Tamboreiros, existe aquele que ficaram para história, cada um em sua época, definiram e regeram tudo que existe de belo dentro do canto e toque do Batuque. Para estes devia existir uma placa de honra ao mérito pelo tudo que eles fizeram pelo Batuque.Ali no Partenon conheci um tamboreiro de nome Borel, que fez escola para tudo que existe dos anos cinqüenta aos anos setenta. Poderia ter havido mais perfeição no canto, nas pancadas que evocam os Orixás, mas as mãos e a voz daquele homem superaram tudo que existiu de mais divino dentro do canto das rezas. Na época eu era um Buri dos anos sessenta e que eu tive a felicidade de me iniciar vendo ele tocar. Um nome que alguém dificilmente esqueceria era do seu Tesourinha, tive a felicidade de participar da festa dos setenta e cinco anos de feitura de seu Orixá Ogum e ser agraciado com seu axé.Nesta ocasião ele morava em Florianópolis e nesta ocasião já de idade avançada, com inúmeros problemas de saúde, e pela diabete estava cego, ao me aproximar e bater cabeça e receber o abraço do pai Ogum, este passou a mãos em meu rosto e me reconhecendo disse-me: “Deodé não tenha medo eu estarei sempre contigo”.O Tamboreiro Oficial da casa de minha mãe Miguela de Bará Agelú chamava-se Micharia, trabalhava na Prefeitura de Porto Alegre. Com ele viajei para Santo Ângelo para inúmeros Batuques em casa de mãe Lilá de Bará lodê.Um dos mais antigos era o nego Zé, filho carnal de mãe Chininha de Yansã, tocou ali no Partenon e deixou muitos alunos de sua escola, era dos poucos que tirava as rezas para o lado do Oió. O Tamboreiro oficial de meu irmão Gelson de Bará Lodê era o negro Tadeu, tornou-se Tamboreiro de mãe Eva de Oxum, naquela casa tocou por vários anos.Um dos mais destacados do Partenon era o Cláudio Barulho, este inclusive fez nome como puxador de samba no Carnaval Porto-alegrense.Carlos de Ogum esposo de Lurdes de Oxum é um nome a se destacar e seus filhos também fizeram escola em Viamão.Aguardamos com uma certa ansiedade os nomes do novo milênio.
Dentro do que era o toque ritualístico o qual eu passo a chamar: “o som do batuque”, dos anos sessenta existia uma maneira de tocar, mas no começo dos anos setenta começou as inúmeras transformações que se não modificaram o essencial dos fundamentos escancaradamente uma energia e performance diferente de tudo que até então se ouvia do som do Batuque.
Não estou falando dos toques (queflê, agueré, odan, locori, tamborinete), não, nada disso modificou, o que modificou a partir dos anos setenta, parece que as pessoas esqueceram, foi à força do toque, a pancada, a batida que chegou com mais força, mais energia.
Não quero ser injusto ao citar o nome de quem começou as modificações, mas para mim que sempre estive observando e estudando o som do batuque, e os grandes mestres do toque e do canto, o grande mentor destas transformações foi o Tamboreiro Carlinhos. 


Sim, era este o nome da fera, aquele menino tocava com uma energia nunca vista, com uma força descomunal, e o mais importante com um largo sorriso estampado naquela enorme boca, a escancarar de orelha a orelha tudo de sua felicidade e satisfação pelo trabalho que executava, se é que ele considerava trabalho tocar para evocar os Orixás. 
O Carlinhos era um belo exemplar da raça negra, corpo atlético, mais parecendo um atleta do Box, braços fortes e mãos de dedos longos, 1.85 cm, tudo nele representava força e energia. 
Tudo me leva a crer que os Orixás haviam moldado aquele tipo físico só para tocar para eles.
Fui num Batuque só para vê-lo tocar, seu nome já era uma lenda viva e para minha surpresa vi ele colocar o tambor no meio das pernas e com uma pequena corda em volta da cintura amarrar para melhor fixar o tambor, para no gesto seguinte dar umas pequenas pancadas em toda a borda do tambor e a seguir pedir agô e despencar a madeira, e põe madeira nisso. Mas ba tchê que cosa de loco.
Eu que nunca tinha participado de uma festa tocada por ele sai dali com o lombo arrepiado de tanta vibração e emoção. 
A partir daquela noite fiquei com certeza que o toque do Batuque nunca mais seria o mesmo, tínhamos avançado uma etapa e as modificações tinham chegado para ficar. 
O toque do Batuque teria mais força e energia.
Até aquela data ninguém se atreveria a por o tambor no meio das pernas e amarrar na cintura, todos tamboreiros tocavam com o tambor deitado sobre uma toalha em cima dos joelhos ou embaixo do braço.
Para mim nunca em tempo algum alguém vai ocupar seu lugar, tanto que os Orixás ouvindo tanta beleza, amor e devoção o chamaram bem cedo para ir morar no Orun, não podiam esperar para vê-lo tocar somente aos sábados, queriam ouvi-lo todos os dias, e lá se foi o Carlinhos de Oxum tocar somente para os Orixás.
Existem vários estudiosos deste assunto com livros publicados, faço questão de citar o professor Braga com o seu magistral livro (nome do livro) que trouxe uma riqueza imensa contribuindo para o verdadeiro conhecimento dos Fundamentos do toque dentro do Batuque, pena que nossos Tamboreiros não leiam. 
Existe uma particularidade que devemos destacar em respeito aos tamboreiros mais antigos, cada um procurava conhecer mais profundamente o toque e o canto dos Axés (rezas) de seu lado (nação) Ijexá, Cabinda, Oió, Jeje com Ijexá. Muitos deles negava-se terminantemente tocar para outro lado (nação), que não fosse de seu conhecimento.
Hoje em sua maioria toca uma mistura de som e canto pouco identificável, o que minha vó Jovita vaticinou há trinta anos atrás: “se este meninos não estudarem as rezas um dia o som e o canto do Batuque será uma doce salada de frutas”. No que ela mais uma vez acertou!
Cada tamboreiro criou seu próprio repertorio, não obedecendo ao critério principal que é a seqüências das rezas e o lado que a identificara perante os participantes.
Tem os que têm a cara de pau de perguntar a que horas o dono da casa quer que termine a festa? Ora... Bolas à festa têm que terminar a hora que tirar a ultima reza para Oxalá. Independente disto à maioria desconhecem o repertório e a seqüência das rezas. E é um tal de comer rezas, suprir algumas, talvez pela dificuldade de canta-las ou por erros na pronuncia e sonância mais difícil, mastigar algumas, enrolar muitas tantas.
Um critério que a maioria malandramente tomou por habito é cantar o que o povo canta, ou seja, se cantar uma reza e não tiver resposta, passa batido e salta para outra. Como a maioria das rezas o povo desconhece e quer me parecer tem preguiça e vergonha de cantar errado, terminam por não responder, resultado: o canto do Batuque termina por sair picotado. Tem-se a nítida imprensam que faltou alguma coisa e terminamos por sair frustrado de muitas festas. Falha imperdoável.
Fico impressionado com a cara de pau de alguns ainda esperarem elogios.
Todo pai de santo sempre se acha melhor que os outros, mas caso dos tamboreiros atuais, esta característica e acentuada. Todos, sem exceção, se sentem melhores que os mais antigos. Ai é dose ter que agüentar estes estrelatos.
O som do Batuque virou um grande comércio, por cinco salários mínimos, é o cachêzinho que a maioria dos tamboreiros cobra nos dias atuais, pode se dar o luxo de escolher quem se quer para tocar nossas festas de Batuque.
Com exigências que extrapola as raias do ridículo, (passagens de avião, hospedagens em hotel cinco estrelas, pagamento via doc. do Banco do Brasil, pagamento de um auxiliar) com abuso que fariam minha vó matar um desgraçado destes com feitiço. O que se vê e que o tamboreiro quer ser mais importante que o que o pai de santo.
O pessoal do interior é o que mais sofre.
Tens uns que quando vão tocar no interior levam a amante e se hospedam em bom hotel, isto significa que o Batuque vai terminar mais cedo, pois ele invariavelmente tem pressa de retornar ao hotel.
Mas tem uma raça desgraçada que para falar nestes, vou abrir um parêntese novo. São os que se ocupam (recebem Orixá). Bem, estes são de doer ter que suportá-los, pois estes infelizes recebem estas coisas nas aspas para dizer bobagem para os filhos de santo da casa onde teve o desprazer de tê-los como tamboreiro. Falando um monte de asneiras e confirmando cabeças e citando fundamentos como quem dá receita de bolo, ensinando feitiços, por ai segue a ladainhas destas porcarias, que no fim a pessoa que os contratou se arrepende.
Lembro-me bem de um fato pitoresco que aconteceu na casa de minha avó que passo a relatar. Em principio minha vó odiava tamboreiro que recebesse santo (ocupar-se). Dizia ela: Tamboreiro é tamboreiro, pai de santo é pai de santo, o resto é pura invenção de quem quer aparecer.
Mesmo sabendo de antemão que a vó não gostava destas elucubrações, o Orixá de um tamboreiro, tinha o mal habito de no meio do Batuque chegar e entrega o tambor para um secretario e se punha a dançar. A pobre da vó enlouquecia, mas fazer o que? Dependia daquele infeliz, tinha que agüentar. Mas a coisa foi ficando difícil de suportar.
Até que uma noite de festa grande ela não agüentou mais e me chamando dize: “Deodé, vai lá no meio do salão e me traga o Bará do tamboreiro”. Fui com tudo e pegando pela mão do Orixá convidei-o a ir até a cozinha, onde a vó estava a nós esperar. A vó então falou: meu paizinho eu estou com a casa cheia de visitas e o senhor chegou e entregou o tambor a um menino que esta estragando minha festa, a responsabilidade é do seu filho.O Bará metido a besta quis dar o ar na negra velha, citanda alguns fundamentos.
-Dona Jovita eu não poderia deixar de me fazer presente em tão rica oportunidade, minha chegada é a confirmação de sua obrigação.
Deu! A negra enlouqueceu e subiu nas tamancas.
O que! Eu Jovita de Xangô cem anos de Batuque precisar da chegada de um Bará Lodê na cabeça de um tamboreiro para confirmar os meus fundamentos. O que faço ou não faço em minha casa, só a mim diz respeito, mas era só o que me faltava, mas isso é uma pouca vergonha, mas a que ponto a gente chegou, por meu pai Xangô, mas me desculpe, mas tenho que tomar uma atitude.
E foi pra já, a negra velha deu de mão na gola da camisa do infeliz e proferiu a sentença final.
-O senhor ponha-se para a rua, e me devolva o sem-vergonha do seu filho, porque eu paguei, e olha que paguei bem caro para ele tocar. Este infeliz vai entregar minha obrigação nem que eu tenha que dar uma surra de rabo de tatu nele, este desgraçado tem que ter responsabilidade com seus compromissos, e de mais a mais eu não lhe convidei para dançar e ponha já da minha frente se não vai sobrar para o senhor também.
O Bará do negrão foi-se inteiro não quis entrar em achêro. Com a maior cara deslavada do mundo voltou a tocar. Só que desta vez o som e o canto tinham melhor qualidade.
Para eximir qualquer duvida minha avó Jovita de Xangô tinha dependurado na porta do quarto de santo um relho rabo de tatu. Perguntada a razão ela fazia a questão de responder: “Isso é para amansar burro chucro e tamboreiro que se faz de louco”: E um conselho que minha vó não cansava de dar a seus tamboreiros: “Onde se ganha o pão, não se come à carne e quem toca para exu não toca para orixá”.Para boa entendedora meia palavra basta e um pingo é letra.
Já era tempo dos atuais pais de santo terem a porta de seus quartos de santos um rabo de tatu. Assim teremos certeza que se não melhorar o som do Batuque pelo menos trará mais dignidade e respeito à profissão de tamboreiro.

10 comentários:

  1. Estava lendo e vi que és irmão de santo de minha mae carnal. Sabrina de Iansã. Sou neta da Mae Miguela do Bara. Adorei o blog. Abraços. E muito axé. Nathalia de Iemanjá

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  2. Show de bola, estou aprendendo a tocar tambor com Mestre Antônio Carlos De XANGÔ e ele é muito crítico aos tamboreiros da nova geração e vem bem de encontro no que vc escreveu.

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  3. Show de bola, estou aprendendo a tocar tambor com Mestre Antônio Carlos De XANGÔ e ele é muito crítico aos tamboreiros da nova geração e vem bem de encontro no que vc escreveu.

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  4. Show de bola, estou aprendendo a tocar tambor com Mestre Antônio Carlos De XANGÔ e ele é muito crítico aos tamboreiros da nova geração e vem bem de encontro no que vc escreveu.

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  5. Escutei muito essas histórias sempre leio seu blog, apenas corrigindo falecida mãe Lila do Bara era de Lana. Abraços muito Asè

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  6. Concordo.os tokes de santo ta misturado com de exu...quero aprender tocar tambor pra santo.eo resta no e comigo...

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  7. Que espetáculo seu comentário a respeito de meu finado pai de santo o grande Carlinhos de Oxúm fiquei encantado com sua descrição. Acompanhei pai Carlinhos nos ultúlti 5 anos de vida em centenas de batuques na grande Porto Alegre.

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